A Missa dos Defuntos - As Cerimônias Meditação para o dia 25 de Novembro
As Cerimônias
Meditação para o dia 25 de Novembro
O simbolismo tocante e belo das cerimônias da Missa dos defuntos não pode ser ignorado de quantos querem assistir com proveito ao melhor e o maior dos sufrágios que se pode oferecer pelos mortos — o Santo Sacrifício dos nossos Altares.
Esta Missa é celebrada com o paramento de cor preta, simbolizando o luto. Não tem o Glória. É semelhante às Missas do tempo da Paixão. Mostra a dignidade do cristão assemelhado a Jesus Cristo na Paixão. Não tem o Salmo Judica me, porque nele se diz: quare tristis est anima mea et quare conturbas me? Por que perguntar à alma porque esta triste quando já foi julgada?
O sinal da cruz que o sacerdote faz sobre si nas outras Missas, aqui é feito sobre o Missal, para dizer que tudo é agora para os mortos, os frutos e méritos da cruz. Nem o padre nem o diácono beijam o Missal, simbolizando que as almas não receberam o ósculo da paz de Deus no céu.
Escreveu o piedoso Mons. Olier:
“Não se beija o Missal no fim do Evangelho primeiro, porque as almas do purgatório morreram em sinal da fé — insigno fidei — não têm necessidade de uma profissão de fé no Evangelho pelo mesmo motivo a Missa dos defuntos não tem Credo, que é a manifestação pública da nossa fé. No ofertório não há bênção da água que é posta no cálice com o vinho, porque a água simboliza os fiéis, e a Igreja não tem jurisdição sobre os fiéis defuntos na outra vida, pois estão em Graça com Deus. No Agnus Dei não há paz, a cerimônia do Pax tecum. As almas já estão na paz de Deus e livres dos perigos do pecado que tira a verdadeira paz. Elas sofrem muito, mas em doce paz. No Agnus Dei não se diz Miserere nobis, mas “dai lhes o descanso”. Imploramos o eterno descanso para as pobres almas sofredoras e em tormentos do purgatório. Elas não precisam de paz, mas de um descanso eterno no seio do Deus. Não há bênção no fim da Missa porque as almas não ouviram ainda de Nosso Senhor: “Vinde, benditas de meu Pai, receber a recompensa…”
Ao invés do Ite, Missa est — “acabou-se a Missa”, a ordem de dispersar os fiéis e anunciar o fim da Missa, diz o sacerdote: Requiescant in pace — “Descansem em paz”. É um convite ao povo, também, para que reze pelos fiéis defuntos e para dizer que todo aquele Augusto Sacrifício foi oferecido para descanso dos pobres irmãos do purgatório. Eis as cerimônias especiais e variantes das Missas dos defuntos. O Introito é uma súplica pelo descanso das almas.
“Dai-lhes, Senhor, o descanso eterno e que lhes resplandeça a luz perpétua”
No gradual, a mesma súplica. No Trato:
“Livrai, Senhor, as almas dos fiéis defuntos das cadeias dos seus pecados. E que o socorro da vossa graça consiga evitar o Juízo da Vingança e gozem a bem-aventurança da luz eterna”
Na Communio é ainda o pedido do eterno descanso:
“Que a luz eterna lhes resplandeça com os vossos Santos por todos os séculos, ó Senhor, pois sois tão bom!”
E pede de novo:
“Dai-lhes o descanso e a luz perpétua, pois sois tão bom, Senhor”
Que belas súplicas pelas pobres almas!
O Dies Irae
O Dies Irae é uma Sequencia da Missa dos defuntos, atribuída ao franciscano Celano, que a teria escrito no ano de 1260. É uma descrição impressionante do Juízo final. Uma meditação das mais vivas daquele dia tremendo em que todo o Universo há de prestar conta ao Juiz dos vivos e dos mortos. Reza-se o Dies Irae nas Missas de Requiem. Comentá-lo seria prolixo e exigiria um volume. Vamos meditá-la traduzida, embora não sem a beleza e a expressão do latim e da forma poética. Servirá muito para nossa meditação. Ei-la:
“Dia de ira aquele em que o Universo terá reduzido a cinzas, segundo as predições de Davi a Sybila.
— Qual não será o terror dos homens quando o Soberano Juiz vier perscrutar todas as suas ações com rigor!
— O som estridente da trombeta acordará os mortos nas profundezas das sepulturas, reunindo-os todos diante do trono do Senhor. A morte e a natureza ficarão estupefatas quando a criatura comparecer para ser julgada pelo Juiz.
— Um Livro aparecerá onde está escrito tudo sobre o que há de versar o julgamento.
— Quando o Juiz se assentar no Tribunal, tudo o que estiver oculto ficara descoberto e nenhum crime ficará impune. Infeliz de mim! Que poderei dizer então? Que protetor procurarei quando somente o Juiz estará tranquilo?!
— Ó Rei, cuja Majestade é tremenda, mas que salvais gratuitamente os escolhidos, salvai-me, ó Fonte de piedade!
— Recordai-vos, ó piíssimo Jesus, de que viestes ao mundo por minha causa; não me condeneis nesse dia.
— Ó Vós, que vos fatigastes em minha procura e que para me resgatardes morrestes numa cruz, não queirais que fiquem infrutíferos tantos esforços! Ó Justo Juiz, que castigais com justiça, concedei-me o perdão das minhas faltas antes do dia do julgamento.
— Eu choro como réu, as minhas culpas envergonham-me. Ó Deus, que as minhas súplicas me alcancem o perdão! Ó Vós, que absolvestes a Maria e ouvistes o ladrão, concedei-me também a esperança! Bem sei que as minhas preces não são dignas, mas vós, que sois bom, não consintais que eu arda no fogo eterno. Colocai-me entre os cordeiros, à vossa direita, e separai-me dos pecadores. Livrai-me da confusão e do suplício dos malditos condenados, e introduzi-me junto dos benditos de Vosso Pai. Suplicante, prostrado ante vós e com o coração esmagado, como reduzido a cinzas, eu Vos imploro, ó Senhor, que tenhais piedade de mim no momento da morte. Dia de lágrimas aquele em que o homem pecador renasça das suas cinzas para ser julgado! Tende pois piedade dele, ó meu Deus! Ó piíssimo Jesus ! Ó Senhor, concedei-lhe o repouso eterno!”.
Não é verdadeiramente impressionante, nela, esta Sequência da Missa dos defuntos?
O Dies Irae é um grito de temor e de esperança. Fala-nos do tremendo Juízo e aponta-nos a doce esperança na Misericórdia do Salvador. Termina: Pie Jesu dona eis requiem. — Piedosíssimo Jesus, dai-lhes o descanso eterno!
Lembra o Juízo para nosso temor e para que andemos vigilantes e preparados, e recorda-nos a Divina Misericórdia, para que nunca desesperemos. Implora misericórdia e descanso para os que já passaram pelo tremendo julgamento e sofrem no purgatório.
Prefacio da Missa dos Defuntos
Outra joia da Liturgia é o prefácio dos defuntos. Uma lição, uma lembrança de nossa imortalidade e ressurreição futura. Não é muito antigo. Vamos meditá-lo:
“Verdadeiramente é digno e justo, racional e salutar que sempre e em todos os lugares vos demos graças, Senhor, Santo Pai Onipotente, Eterno Deus, por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo, em quem nos concedestes a esperança da feliz ressurreição; de sorte que, conquanto a condição certa da nossa morte nos entristeça, fiquemos consolados com a esperança da imortalidade futura. Pois para vossos fiéis, Senhor, a vida muda-se, não se acaba, e desfeita esta morada terrena, adquire-se a habitação eterna nos céus. E por isso, com os Anjos e Arcanjos, com os Tronos e as Dominações, e com a Milícia celeste, cantamos o hino da vossa glória, dizendo sem cessar: Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus dos Exércitos. O céu e a terra estão cheios da vossa glória. Hosana no alto dos céus”
Eis o belo Prefácio dos defuntos. Fala-nos da esperança da ressurreição futura. Estamos tristes neste mundo porque nossa condição de pobres mortais, sujeitos a deixar esta vida pela morte. Todavia, temos a promessa da imortalidade. Não morreremos de todo. A morte para o cristão é vida. Nas catacumbas escreviam nas lages sepulcrais às vezes uma palavra só: — Vixit! Viveu! É a idéia do Prefácio. A vida do cristão é a mesma. Aqui a vida na graça, e depois a vida na glória. Muda-se apenas a condição da mesma vida. Vita mutatur, non tollitur, diz o Prefacio — a vida se muda, mas não se acaba.
Que lição confortadora!
Diz o Apóstolo que não temos neste mundo morada permanente. Non habemus hic manentem civitatem. — Não pertencemos a este mundo. A Igreja nos chama viatores, caminhantes. Vamos para a casa de nossa eternidade. É o que nos recorda o Prefácio dos defuntos. Desfaz-se nossa morada terrena, pobre e miserável, e adquirimos uma eterna morada no céu!
A Liturgia dos mortos é pois uma continua lembrança aos vivos da morte e do Juízo, um despertar da nossa fé na imortalidade da alma e na vida futura, um brado para que estejamos vigilantes, porque na hora que menos pensarmos, virá o Filho do Homem. É, principalmente, um incentivo para que não nos esqueçamos de nossos mortos queridos.
Procuremos assistir a Santa Missa dos defuntos com muita devoção e acompanhá-la no Missal ou no folheto litúrgico. Ela é verdadeiramente impressionante e nos leva a uma meditação muito séria da morte e do Juízo.
Ainda há pouco o Santo Padre Pio XII, na oportuna Encíclica Mediator Dei, condenava o erro dos que desejariam suprimir as Missas dos defuntos de nossa Liturgia e condenam o paramento de cor preta, sob pretextos sutis de que prejudicam o chamado Movimento restaurador da Liturgia. A Igreja, que vela pelo esplendor das solenidades litúrgicas, nem sempre permite a Missa dos defuntos em grandes festas, mas como é generosa e permite com frequência estas Missas para ensinamento dos fiéis e alivio das pobres almas!
Exemplo: Santa Isabel, Rainha de Portugal, e sua filha Constância
A grande Santa da caridade tinha uma filha que muito amava, chamada Constância. Esta princesa havia se casado há pouco tempo com o rei de Castela, quando uma morte repentina veio arrebatá-la à afeição dos seus. A rainha, ao ter a infausta notícia, juntamente com o rei se pôs a caminho de Santarém, quando um eremita se aproxima do cortejo real e quer falar à rainha. Os fidalgos disseram logo: é um importuno, um doido. Não lhe demos importância! Santa Isabel percebeu tudo e mandou chamar o pobre monge, perguntando-lhe o que desejava.
— Senhora, a vossa filha Constância me apareceu diversas vezes e foi condenada a um longo e rigoroso purgatório, mas será libertada no prazo de um ano se celebrarem durante um ano todo, todos os dias, uma Santa Missa por ela.
Os do cortejo real puseram-se a rir do monge: é um doido, diziam. É um intrigante e quer arranjar alguma coisa, repetiam outros. A rainha, entretanto, levou o caso muito a sério. Pediu ao esposo que mandasse celebrar as Santas Missas. Dizia: Afinal, o que se poderia sair perdendo com isto? Não é bom mandar celebrar Missas pelos nossos mortos? Quanto não há de lucrar com isto a nossa filha, ainda que não fosse real a aparição do pobre monge!
No dia seguinte encarregou a um sacerdote de celebrar durante o ano todo por alma da filha. Exatamente quando completou um ano, Constância apareceu à sua santa mãe vestida de branco, toda luminosa e de uma beleza incomparável.
— Hoje, minha querida mãe, graças às vossas orações e às Santas Missas que mandastes celebrar, estou livre dos meus tormentos e subo para o céu.
A Santa, toda radiante de felicidade, foi procurar o Pe. Mendez, sacerdote encarregado da celebração das Santas Missas, e este já vinha ao encontro da rainha para lhe dizer que, na véspera, havia celebrado a última das 365 Missas encomendadas por alma de Constância.
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(BRANDÃO, Monsenhor Ascânio. Tenhamos Compaixão das Pobres Almas! 30 Meditações e Exemplos sobre o Purgatório e as Almas. 1948, p. 194-201)
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